O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou nesta sexta-feira (3) que a crise energética é um "problema grave" para o país nos próximos meses e que o BC fará o que for necessário para conter os reflexos na inflação.
Campos Neto explicou que os reajustes da energia elétrica, motivados pelas taxas extras anunciadas pelo governo para conter o consumo da população, já têm gerado forte impacto na inflação — que está em cerca de 9% em doze meses, patamar considerado "bastante elevado".
O Brasil enfrenta a pior estiagem dos últimos 91 anos. Para preservar a água dos reservatórios das hidrelétricas, as usinas termelétricas – mais caras e poluentes – estão sendo acionadas para garantir o fornecimento de energia. Por isso, houve aumento no custo da geração de energia, e o valor é repassado aos consumidores.
A bandeira tarifária já foi reajustada, em junho deste ano e, mais recentemente, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) anunciou um novo patamar de taxa extra para as contas de luz de todo o país, com a entrada em vigor, nesta quarta-feira (1º) da "bandeira tarifária escassez hídrica", que adicionou R$ 14,20 às faturas para cada 100 kW/h consumidos.
"Obviamente, o reajuste da eletricidade, com os diversos reajustes de bandeira vermelha, e essa última bandeira da crise hídrica, realmente têm impactando bastante [a inflação]. A eletricidade tem o poder de disseminar na cadeia [de produtos e serviços] esse aumento. A gente tem olhado isso bastante de perto", disse Campos Neto, em evento transmitido pela internet.
"Se a gente tem uma chuva mesmo um pouco abaixo da média, mas mesmo assim os reservatórios ficam acima de 10%, isso não implica em racionamento. O Brasil até diminuiu a dependência hídrica, mas é um problema bastante grave para a gente nos próximos meses", acrescentou.
Questionado nesta quinta-feira (2) sobre a possibilidade de haver racionamento compulsório de energia no país neste ano, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, afirmou que não há como prever o futuro. Até então, o ministro negava enfaticamente a possibilidade de racionamento.
De olho nos preços da energia elétrica e dos serviços, o presidente do BC afirmou que a instituição tem os instrumentos necessários para trazer a inflação para a meta central no chamado "horizonte relevante" (de seis a 18 meses). E repetiu que a instituição vai "fazer o que for necessário" para isso.
"A gente tem falado bastante sobre os sucessivos choques [inflacionários, como alimentos, combustíveis e energia] e como isso tem se disseminado na cadeia de inflação, com uma persistência que tem sido um pouco maior. Tem gerado uma inércia [tendência de a inflação seguir alta] recente. O Banco Central precisa combater isso. É isso que a gente tem feito", acrescentou Campos Neto.
As metas de inflação são fixada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Para alcançá-las, o BC eleva ou reduz a taxa básica de juros da economia, que atualmente está em 5,25% ao ano. A instituição define a taxa Selic com base na expectativa futura de inflação. O mercado estima que o juro básico subirá para 7,5% ao ano no fim de 2021.
O centro da meta de inflação, em 2020, é de 3,75%. Pelo sistema vigente no país, será considerada cumprida se ficar entre 2,25% e 5,25%. No ano que vem, a meta central de inflação é de 3,50% e será oficialmente cumprida se o índice oscilar de 2% a 5%.
A expectativa das instituições financeiras para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial do país, está em 7,27% para 2021, acima do teto de 5,25% do sistema de metas, e em 3,95% para 2022 — ainda dentro do intervalo de tolerância.