Na representação que o Ministério Público de Alagoas (MPAL) enviou aos juízes da 17ª Vara e que a reportagem teve acesso, é narrado que o cabo que comanda a guarnição liga para a vítima e, “de forma intimidatória”, avisa que ela teve sorte por ter sido o primeiro veículo a ser parado e a câmera não estava ligada.
Logo em seguida, o cabo pergunta se a vítima poderia fazer um PIX. Diante do pedido do militar, a vítima pede para que o cabo ligue após trinta minutos e o militar, “novamente em tom de intimidação”, relata que está com os dados da vítima todos prontos e que precisa repassar (dependendo do pagamento).
O documento mostra que após trinta e sete minutos o policial retorna a ligação e diz que “não tem o interesse de explorar um pai de família e manda ele realizar um PIX e passa a chave”. A chave enviada é um e-mail. A vítima diz que vai colocar cem reais na conta que o militar enviou, mas o cabo intervém e diz que não e manda colocar cento e cinquenta reais para cada um membro da guarnição.
Foi após o cabo dizer a chave pix nesta conversa que os promotores descobriram que se tratava de uma conta também em nome de um homem citado anteriormente em cobranças de propinas. Segundo os promotores, com o avançar das investigações, foi possível vincular o homem titular da conta com a policial feminina da guarnição, tendo em vista que, com a quebra de sigilos de dados do Whatsapp, foi percebido que ambos o homem e a policial possuem os contatos registrados em suas agendas pessoais do celular.
GUARNIÇÃO ERA FORMADA POR DOIS HOMENS E UMA MULHER
No começo dos trabalhos, os promotores investigaram duas guarnições do batalhão, a Rotran 1 e Rotran 2. De imediato foi identificado que o titular da conta bancária para onde a propina era enviada não é Policial Militar, e que ele trabalha como corretor de planos de saúde e odontológicos.
Com o caminhar das investigações, a participação da Rotran 2 foi descartada, mas em relação à Rotran 1, “foi possível obter fortes indícios de autoria e materialidade, sobretudo dos delitos de concussão."
Conforme consta nos documentos que a Gazetaweb teve acesso, os dois cabos foram presos em Maceió, um no Conjunto Jardim Royal, no bairro Cidade Universitária, e outro em um apartamento no bairro Ponta Verde. Já a soldado foi presa no Conjunto Belo Jardins, no bairro Boa Vista, em Arapiraca. Por fim, o preso, que não é militar, foi detido na Ponta da Terra, em Maceió.
Os documentos mostram que as investigações começaram em julho deste ano e detalham a forma como os policiais agiam. “Abordavam aleatoriamente motoristas em via pública e, em caso de encontrar possível irregularidade, obrigavam o condutor a pagar propina com o intuito de não ter a multa aplicada, e até mesmo a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) ou o próprio veículo recolhido", informa trecho da representação.
Os promotores continuam narrando que o pix era a alternativa usada pelos militares para as pessoas que não tinham dinheiro em espécie para pagar o suborno. “Para aqueles motoristas que no momento da abordagem alegavam não possuir dinheiro para escapar da multa e consequentemente a apreensão de sua CNH e veículo, era oferecida a modalidade de 'pagamento da propina via PIX'".
“Assim, para deixar o cidadão sem alternativas, os suspeitos, de forma deliberada e cinicamente, obrigavam a serem feitas transferências bancárias, via PIX, só liberando o veículo e o motorista após a comprovação da operação bancária”, detalha o documento.